Iodo ressublimado
Em termos comerciais, a mercadoria iodo ressublimado é descrita da maneira que se segue:
Sólido, apresentado em frascos plásticos com peso líquido de 500g;
Concentração mínima de iodo: 99,5%, em peso;
Impurezas totais, não voláteis: 0,001%, em peso;
Cloro e bromo (expressos como cloro): 0,005%, em peso;
PRECAUÇÕES: armazenar o produto em local fresco e seco, com boa ventilação e longe de fontes de calor, umidade e produtos corrosivos. Usar EPI (máscara facial, óculos de segurança, avental, botas e luvas de borracha ou PVC);
FOGO: produto não combustível. Usar extintor de pó químico, seco ou espuma;
VAZAMENTO: estancar o vazamento, ventilar a área afetada, recolher o produto em sacos plásticos e dissolver o restante com solução de tiossulfato de sódio acidulada levemente com ácido sulfúrico diluído e lavar com água em abundância;
PELE: lavar o local afetado com água em abundância por 15 min., proceder à limpeza com solução de 5% de tiossulfato de sódio e lavar com água e sabão;
OLHOS: lavar com água em abundância com as pálpebras abertas. Procurar um oftalmologista;
INALAÇÃO: conduzir a vítima a um lugar ventilado e, em seguida, encaminhá-la ao socorro médico;
INGESTÃO: não provocar vômito; caso a pessoa esteja consciente, lavar a boca com água em abundância, dar água ou leite para beber. Procurar auxílio médico;
Essa informação não é suficiente para que se possa compreender de fato a mercadoria em tela; assim, faz-se necessário buscar informações técnicas que ajude a formar a convicção sobre a mercadoria.
A primeira informação técnica é obtida quando se descobre, por meio de um dicionário, que o iodo é um elemento químico, pertencente aos halogênios. A partir daí, pode-se solicitar a um técnico (e.g., químico ou engenheiro químico) ou buscar na literatura, inclusive na internet, informações sobre os halogênios e o iodo ressublimado. Tal busca por informações conduziu ao seguinte memorial técnico (isto é, resumo técnico de fatos técnicos significativos):
O termo halogênio provém do grego (halos: “sal, mar, pesca”; geneo: “nascido em determinada condição”) e, na Química, tem a significação de “formador de sal”, pois ao reagir diretamente com os metais resulta nos correspondentes sais desses metais. A formação de sais, bem como a reação dos halogênios com os não-metais, é explicada, em termos técnicos simples, segundo Lee, pela capacidade que os átomos de halogênios têm de completar oito elétrons, da última camada da sua eletrosfera, “por meio da formação de íons e de ligações iônicas ou então compartilhando um elétron com outro átomo, ou seja, formando uma ligação covalente”.
A propósito do iodo, Atkins et alii lecionam que (in verbis): O iodo é encontrado como íon iodeto em salmoura e como uma impureza no salitre do Chile. Ele era obtido de plantas marinhas, que contêm altas concentrações de água do mar: 2.000 kg de plantas marinhas produzem cerca de 1 kg de iodo. A melhor fonte moderna é a salmoura dos poços de petróleo marinhos, onde o próprio óleo foi produzido pela decomposição de organismos que tinham acumulado o iodo enquanto eles estavam vivos. (...) O sólido brilhante, preto azulado, sublima-se facilmente e forma um vapor púrpura”.
Os halogênios, por serem elementos químicos, se inserem no âmbito da Química Inorgânica, de forma que o iodo ressublimado é um produto químico inorgânico.
O tamanho desse memorial técnico pode ser tão grande e complexo quanto cada caso concreto exija; todavia, para o iodo ressublimado, esse memorial nos basta.
Como o iodo é um elemento químico, do tipo halogênio, e, por isso, um produto químico inorgânico, então nossa hipótese inicial sobre a mercadoria do presente caso será que ela se aloja na Seção VI, mais especificamente no Capítulo 28.
A hipótese a ser verificada é “iodo ressublimado se classifica no Capítulo 28 da NCM”. Tal verificação deve ser feita através dos seguintes passos:
1º) A aplicação da 1ª Regra para a Interpretação do Sistema Harmonizado (RGI) às Notas da Seção VI nada revela, pois as mesmas não se pronunciam sobre o iodo ressublimado.
2º) Procedendo de igual maneira no âmbito das Notas do Capítulo 28, surge a primeira evidência a favor da classificação do iodo nesse Capítulo, pois:
A Nota 1.a) do Capítulo 28 diz que (grifou-se para destacar): “1.-Ressalvadas as disposições em contrário, as posições do presente Capítulo compreendem apenas: a) os elementos químicos isolados ou os compostos de constituição química definida apresentados isoladamente, mesmo contendo impurezas;”
Dessa maneira, como a mercadoria “iodo ressublimado” é um elemento químico, apresentado isoladamente e que contém impurezas, então se aplica aqui, pelo emprego da 1ª RGI, a Nota 1.a) do Capítulo 28.
3º) Decorre dessa hipótese inicial, também por meio da aplicação da 1ª RGI, que a posição 2801 é o nicho onde aloja o iodo, haja vista que o texto dessa posição diz: “flúor, cloro, bromo e iodo”.
4º) Em regra, feita a identificação da possível posição para classificar a mercadoria deve-se buscar esclarecimentos nas NESH dessa posição. Além deste ditame equilibrado, no presente caso, verificar as NESH da posição 2801 assume maior relevância, pois a mercadoria é “iodo ressublimado” e sobre a mesma nada se encontra nos textos da posição, subposição e item.
A propósito do iodo, as NESH da posição 2801 dão os seguintes ensinamentos:
O iodo extrai-se, quer das águas-mães dos nitratos de sódio naturais, tratadas pelo gás sulfuroso ou pelo hidrogenossulfito de sódio, quer das algas marinhas, por secagem, incineração e tratamento químico das cinzas.
O iodo é um sólido muito denso (densidade 4,95 a 0°C), cujo cheiro lembra simultâneamente o do cloro e do bromo; é perigoso respirá-lo. Sublima à temperatura ambiente e cora de azul a goma de amido. Apresenta-se em grumos ou pó grosseiro quando impuro (queijo de iodo bruto), em palhetas brilhantes ou cristais prismáticos, acinzentados, de brilho metálico, quando purificado por sublimação (iodo sublimado ou bissublimado); acondiciona-se, então, geralmente, em frascos de vidro amarelo. Emprega-se em medicina, em fotografia, na preparação de iodetos, na indústria de corantes (na preparação da eritrosina, por exemplo), na preparação de medicamentos, como catalisador em sínteses orgânicas, como reagente, etc”.
5º) Como as NESH nada dizem sobre o iodo ressublimado, mas apenas sobre o iodo, então pela aplicação da 6ª RGI, classifica-se essa mercadoria na subposição de 1º nível não desdobrada 2801.20.
6º) Na subposição 2801.20, observa-se a existência de desdobramento no Mercosul que abarca o “iodo sublimado”, nome este parecido com “iodo ressublimado”. Decorre daí que se faz necessário primeiro proceder uma investigação técnica sobre o que vem a ser “iodo ressublimado” e, em seguida classificá-la no código NCM, pois no âmbito do Mercosul somente o código SH relativo ao iodo sofre desdobramento de forma a destacar o iodo sublimado dos outros tipos de iodo, tal como o iodo bruto. Dessa maneira, tem-se:
2801 FLÚOR, CLORO, BROMO E IODO
2801.10.00 – Cloro
2801.20 - Iodo
2801.20.10 Sublimado
2801.20.90 Outros
2801.30.00 – Flúor; bromo
7º) A questão técnica pode ser solucionada fazendo-se a seguinte pergunta ao laboratório: a expressão “iodo sublimado” é equivalente a “iodo ressublimado”?; explique.
Uma típica resposta do laboratório a essa questão é apresentada a seguir:
A sublimação é a mudança do estado sólido para o estado gasoso ou vice-versa, sem passar pelo estado líquido. Também é chamado de ressublimação a passagem do estado gasoso para o sólido se considerar que a sublimação seja apenas a passagem do estado sólido para o gasoso. Mas muitos químicos consideram que sublimação é o nome de ambos os processos e desconsideram o substantivo ressublimação.
Consoante o Hackh’s Chemical Dicitionary a sublimação é a produção de um sublimado, que é obtido pela deposição do vapor obtido diretamente do aquecimento da fase sólida de uma substância. A sublimação é a produção de um sublimado; é usada para purificar substâncias, tais como o iodo (sublimation – the production of a sublimate; used to purify substances; as, iodine. Sublimate - the deposit formed on heating substances which pass directly from the solid to the vapor phase and then back to the solid state. Resublimed – purified by repeated sublimation).
Ressublimado, de acordo com o American Dictionary of the English Language, é aquilo que foi sublimado por uma segunda vez (Resublimed - sublimed a second time).
A sublimação pode ser usada para purificar sólidos. O sólido é aquecido até que sua pressão de vapor se torna grande o suficiente para ele vaporizar e condensar como sólido numa superfície fria colocada logo acima. O sólido é então contido na superfície fria enquanto as impurezas permanecem no recipiente original.
Técnica que se usa quando um dos componentes da mistura sólida sublima facilmente, isto é, passa directamente do estado sólido ao estado gasoso, por aquecimento, e do estado gasoso ao estado sólido, por arrefecimento. Pode usar esta técnica para separar, por exemplo, o iodo da areia.
A despeito da corrente que considera sublimação a passagem do sólido para vapor e ressublimação a passagem do vapor para o sólido, o pensamento que se verifica nas fontes bibliográficas internacionais é que ressublimação é a repetição da sublimação. Assim, “iodo sublimado” ´pe diferente de “iodo ressublimado”, haja vista que este último sofreu duas sublimações ao invés de uma do “iodo sublimado”
Em consequência, pode-se se concluir, com base nas informações técnicas disponíveis, que o iodo pode sofrer mais de uma sublimação e, nesta situação, passa a ser denominado “iodo ressublimado” (iodo que sofreu mais de uma sublimação).
Dessa maneira, tendo em mente a Regra Geral Complementar (RGC) nº 1, que prevalece no Mercosul, o “iodo ressublimado” deve ser classificado no código NCM 2801.20.90 (Outros), visto que não é possível classificá-lo no código NCM 2801.20.10, dedicado exclusivamente ao “iodo sublimado”, pois os termos sublimado e ressublimado diferem nas suas significações.
Por fim, acrescenta-se que o atual desdobramento da subposição 2801.20 é inapropriado e que ao invés de “sublimado” melhor seria utilizar o termo “purificado” de tal modo a alojar o “iodo sublimado” e “iodo ressublimado”.
Cesar Olivier Dalston, www.dalston.com.br.
Fontes: NESH; Novo Aurélio – Dicionário da Língua Portuguesa – século XXI; 3ª ed.; Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999; ATKINS, Peter; JONES, Loretta. Princípios de Química: questionando a vida moderna e o meio ambiente, Porto Alegre, Bookman Companhia Editora, 2001; HACKH’S CHEMICAL DICTIONARY (Ed. Julius Grant), Fourth Edition, New York, McGraw-Hill Book Company, 1972.